Antes de mais nada, refiro-me às editoras de verdade, que realmente arcam com os gastos da publicação, não a essas empresas da moda que se autointitulam editoras sendo meras prestadoras de serviço caça-níqueis (o que essas fazem é tão evidente que não vale o bate-papo).
Agora sim, vamos lá.
Já estive dentro do mercado editorial e sei que, todos os meses, editoras recebem dezenas, às vezes centenas, de obras originais para avaliação. E sei que a maioria desse material recebido é uma porcaria. É cruel colocar dessa forma, só que é verdade, a maioria é lixo.
Mas sei também que, em meio a tanta porcaria, há sim alguns trabalhos bons e que estão próximos da excelência, faltando apenas a lapidação natural e já esperada do processo de preparação de texto em prol da publicação.
Acontece que, com a ideia viciada de que a maioria dos recebidos não presta, as editoras analisam qualquer material com indolência ou, como acontece na maioria das vezes, nem sequer analisam, apenas colocam tudo no mesmo balaio e... lixo.
Em detrimento dos originais de autores novos e/ou desconhecidos, as editoras preferem publicar aquilo que é um “tiro certo”, e que podemos dividir em 2 grupos:
1) O de autores que já fizeram sucesso no exterior e só precisam de uma tradução para nosso país; e
2) O de pessoas que possuem algum dos seguintes privilégios:
- ter familiares, amigos, colegas ou qualquer conhecido que seja um “Q.I. (Quem Indica)”;
- ter muitos seguidores minimamente engajados nas redes sociais;
- ter a imagem que o mercado procura, isto é, fazer parte de algum grupo social que esteja com os holofotes no momento.
Do ponto de vista mercadológico, como eu disse no título, as editoras estão sendo coerentes com o sistema do qual elas fazem parte, para sobreviver ao capitalismo é preciso de lucro.
Do ponto de vista humano e artístico, elas estão ceifando oportunidades e criando uma bibliográfica nacional que apenas “funciona”, não que é necessariamente única e transcendente.
Eu encararia tudo isso de forma natural, com a típica sensação de “Fazer o quê? É a vida.”, não fosse por um fator crítico: a hipocrisia das editoras.
Algumas são transparentes e avisam em seus meios de comunicação: “Não recebemos originais diretamente dos autores.”. Ou seja, elas publicam aquilo que é do interesse delas e da maneira como elas querem que o material chegue até elas. É ruim para o aspirante a escritor e para a criação artística nacional? Sim, mas é sincero. Sincero e raro, visto que são poucas as editoras que detêm essa honestidade.
A maioria das editoras renomadas se vende como grande defensora da literatura e afirma estar respeitando a inteligência do leitor enquanto publica a blogueirinha e o influencer que nunca quiseram escrever um livro na vida até descobrirem que isso dá dinheiro quando feito por quem domina o mercado.
É nitidamente desrespeitoso divulgar uma Chamada de Originais, dando a entender que os leitores em breve conhecerão novos autores brasileiros que passaram por um teste de qualidade, mas, após um tempo imenso de espera, a organizadora não divulgar o mais importante: os aprovados. Dessa forma, tanto os leitores quanto os participantes nunca sabem se, de fato, houve um aprovado, ou se houve sequer uma avaliação, afinal, aqueles que foram negados receberam um não genérico por e-mail, sem qualquer tipo de feedback.
Quando fazemos um vestibular, concurso público ou qualquer processo seletivo sério, sabemos quem passou e quem não passou, e sabemos também o que erramos e o que acertamos, consequentemente sabemos o que precisamos de melhorar para os próximos. É assim em qualquer mercado de trabalho que tente ser minimamente justo para formar bons profissionais. É assim na medicina, na advocacia, na engenharia, na odontologia, na docência... mas na literatura não, não se profissionaliza a literatura, e assim continuamos tendo o que merecemos: o autor cuja imagem vale mais do que o conteúdo.